segunda-feira, 3 de maio de 2010

Assuntos que ninguém fala

A Torre de Babel está entre nós. Reparou como cada vez mais a gente ouve alguém citar ou perguntar de assuntos sobre os quais nunca “ninguém fala nada”? E, na verdade, muitos deles a gente já nem aguenta mais. Em plena era da comunicação, isso não existe. O problema é que ninguém presta atenção em mais nada. Fica todo mundo falando sozinho. Na época de eleição a situação piora, com as teorias conspiratórias.


Na rua, um rapaz com fone de ouvido encontra outro, também com fone de ouvido, os famosos fiozinhos brancos. Cumprimentam-se. Cada um deles tira um fone, de um lado. Continuam conversando. Sigo caminho pensando o que será que está tocando em cada ouvido? Leio sobre uma nova moda, de “baladas silenciosas”, onde todos estão juntos, mas cada um ouve uma música, particularmente, batucando na orelha. É ou não é a Torre de Babel? Para que se encontrar para falar cada um uma língua, vibrando numa direção? Imagine você ouvindo bossa nova e conversando com alguém escutando heavy metal. Dá liga? Dá conversa? Qual é a graça? E não me venham ser politicamente corretos e falar em cumpridores de leis de silêncio. Não mude meu assunto. Quero falar sobre a falta de comunicação. Porque o silêncio, este não existe mais. Desista.

Posso quase apostar que você tem ou já teve um (a) funcionário (a), ou pessoas conhecidas, assim. Você começa a explicar uma coisa, ele (a) faz aquela cara de já entendi, mal espera o final da frase e sai, para fazer tudo errado. As pessoas só estão ouvindo o que elas querem ouvir, e só até onde elas querem. O resto deixa para lá, estou-com-pressa, muita-pressa. Ah, que pena, errei, vou fazer de novo! Esqueci que você falou!

Ninguém presta atenção, e as camadas de comunicação, os trechos, vão chegando e saindo, como ondinhas no mar. Assim, diariamente recebemos mensagens já do tempo do onça, desmentidas, repisadas, mas a coisa continua. Vai realmente ser um problema esse mundo da internet, onde ainda por cima nenhuma ficha se limpa, pior que o papel que aceita tudo, esse virtual aceita pseudônimos, endereços falsos, a covardia encoberta pela máquina.

Presta atenção. Na internet isso acontece aos baldes. Eu vivo com uma pazinha recolhendo lixinhos, tipo demissão de Alexandre Garcia da Globo, do Jabor censurado, da Super Salete contra os bancos. Sobrou até para a Marília Gabriela que a gente sabe que não deve gostar da Dilma, mas que jamais escreveria o texto que está circulando em seu nome. De zumzumzum em zumzumzum, ouvi desde projetos mirabolantes que estariam votados ou sendo votados até que a candidata mesmo seria Dona Marisa, a Muda, ou que o Lula ia, vejam só, se candidatar a vice da Tia Vilma, Zilma, Dilma. Parecia quando diziam que o Serra não seria candidato, não. Eu que ia ser.

Coisa chata!

E está piorando com o Exército do Mal, arregimentado para encher nossas picuinhas, principalmente se formos identificados como oposição ao atual descalabro. Os radicais livres, os estrelas vermelhas, os apanelados e os chatos de galocha não dão sossego e ainda tentam promover debates intermináveis. Sim, intermináveis, porque nem nós queremos ouvi-los, muito menos eles, os nossos argumentos. Cada fone de ouvido toca uma música. E todas desafinadas. Casas de milionários árabes passam para as mãos dos filhos do Lula, assim como fazendas. E os romances? Não me venha dizer que ainda não ouviu, com ar de informação quente, da cozinha, quem é a nova namoradinha do Lula…

Agora inventaram uma ficha do Serra, sobre a atuação que ele teria tido na constituinte de 88. Ok. Procure o original desse estudo. Quando achar um pedacinho, se achar, uma vez que o site oficial do Diap não funciona, verá na letra miúda que aquelas notas baixas não têm nada a ver e que, ufa, “ele esteve ao lado dos trabalhadores”. Renan Calheiros, por sua vez, saiba, já tirou 10. Troféu Óxente para ele.

Avaliar é uma coisa. Burrice é outra. Essas histórias de listas, de rankings, umas furadas: Hitler também foi listado entre os mais influentes. Coisa chata também é essa de “só estou repassando”. Não precisamos criar mentiras. Eles próprios as criam, e oficialmente, tipo Norma Bengell Roussef da Silva, o cúmulo da cara de pau. Eles próprios criaram um país imaginário, onde tudo corre bem, o comércio está a mil maravilhas e todos são felizes proprietários de um título de classe média abaixo da média. Falam de um tal poder de compra. Vendem carros de baciada e não sabem o que fazer com as estradas, com o meio ambiente, com os combustíveis, com o número de mortes no trânsito.

Pois então, aguenta. Ninguém está falando nisso: no perigo da bolha do futuro, das ações reais para melhorar a qualidade de vida das pessoas, e a qualidade de seu comportamento, no planejamento das cidades, no aproveitamento dos recursos naturais e no desenvolvimento digno para que todos possam vir - quem sabe um dia? - a falar a mesma linguagem.

São Babel Paulo, a tal terra das oportunidades, onde estamos ficando surdos.

(*) Marli Gonçalves é jornalista. Como estudei comunicação, sei bem da facilidade com que as coisas correm com o vento. Já fui e sou vítima dessas verdades que nunca existiram. Gente que não conheço, amigos que não tenho, conversas que não mantive, loucuras que não fiz, confidências que guardei.

P.S. informativo Express: Segundo o Antigo Testamento (Gênesis 11,1-9), torre construída na Babilônia pelos descendentes de Noé, com a intenção de eternizar seus nomes. A decisão seria fazê-la tão alta que alcançasse o céu. Esta soberba teria provocado a ira de Deus que, para castigá-los, confundiu-lhes as línguas e os espalhou por toda a Terra. Por: Marli Gonçalves

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